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Jornalista: Marcia R. Corradini 
30/09/2020 - O auge da pandemia do covid-19 mostrou que, apesar de cerca de 6% da população brasileira - mais distante das cidades ou abaixo da linha de pobreza - não ter como comprar remédios, existe no país uma robusta política de acesso a medicamentos, se comparado ao resto do mundo. A divisão de responsabilidades dos entes federais, estaduais e municipais acabou se revelando eficiente no enfrentamento da maior crise sanitária da história, graças ao maior entrosamento oficial ante a crônica escassez de recursos. 
 
“O Sistema Único de Saúde (SUS) é determinante na questão de acesso a saúde e medicamentos no Brasil, principalmente se considerarmos suas dimensões continentais”, afirma Fábio Antoneli, diretor de especialidades da Sandoz do Brasil. A companhia tem pelo menos 15% das suas vendas ao varejo no Brasil advindas do programa federal Aqui tem Farmácia Popular, bancado pelo Ministério da Saúde. A Sandoz, que tem no setor de varejo farmacêutico quase 70% da sua receita local, deve fazer três lançamentos de biossimilares em 12 meses destinados ao governo/SUS. 
 
Para 2020, estavam orçados R$ 2,4 bilhões para a compra de medicamentos só no programa Farmácia Popular, e mais uma verba extra redirecionada pelo Ministério da Saúde para atender a pandemia, que pode elevar gastos com remédios a pouco mais de R$ 3 bilhões até o fim deste ano. 
 
Além da Sandoz, Aché, Merck, Eurofarma, EMS, outros grandes produtores de genéricos têm larga fatia da receita do varejo vinda do Farmácia Popular. E as recentes discussões de reformulação do programa, capitaneada pela equipe econômica do governo federal, chamaram a atenção do setor. “É claro que todo programa pode ser melhorado, mas não desmontado. Hoje, infelizmente existem pessoas que têm condições de pagar até R$ 1,5 mil por uma consulta com especialistas e depois vai com a receita pegar remédio de graça no Farmácia Popular. Então, podemos simplesmente restringir os medicamentos desse programa somente ao receituário do SUS, por exemplo”, pondera Nelson Mussolini, presidente executivo do Sindicato da Indústria Farmacêutica (Sindusfarma). 
 
O Farmácia Popular tem a adesão de pouco mais de 35,5 mil farmácias privadas espalhadas pelo país, das quase 80 mil unidades registradas no Brasil. Sérgio Mena Barreto, presidente da Associação Brasileira das Redes de Farmácias (Abrafarma), lembra que o investimento público em medicamentos evita um custo de 10 a 20 vezes maior ao Estado, com a internação de pacientes com doenças crônicas nas unidades do SUS. 
 
“A receita da farmácia popular para nós é irrisória, mas atrai um público grande que antes não frequentava farmácias”, afirma Mena Barreto, cuja entidade representa 8,5% do volume de vendas e 45% da receita do varejo nacional de remédios. As 23 redes da Abrafarma faturaram R$ 32,4 bilhões no primeiro semestre e a venda de medicamentos cresceu 9,5% na comparação com igual período de 2019. 
 
Além do programa do Farmácia Popular, o governo investe nas Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDPs) com o setor privado para a transferência de tecnologia na produção de medicamentos em larga escala e baixo custo. Essas parcerias, que envolvem desde vacinas a medicamentos de alta complexidade e tecnologia de ponta, nos âmbitos federal, estadual e até municípios mais ricos, são a modalidade que mais cresce atualmente no país. 
 
Ricardo Pacheco, diretor-geral do Laboratório Cristália, conta que sua empresa possui 20 PDPs ativas, sendo que desse total 13 produtos já estão sendo comercializados e outros sete já foram aprovados. “Entre as parcerias, podemos destacar as primeiras concluídas e entregues no país, em 2011, como os antipsicóticos clozapina, quetiapina e olanzapina, na parceria com o Laboratório Federal de Pernambuco (LAFEPE). Também fizemos o primeiro hormônio do crescimento humano biossimilar 100% brasileiro, a somatropina. O Cristália possui uma parceria, com a Fiocruz/Farmanguinhos para a produção desse hormônio de alto custo, que até então era importado”, relata Pacheco. As vendas totais do Cristália para o governo representam 33% do faturamento da empresa, incluindo PDP’s, licitações, leilões eletrônicos e outros. 
 
Outro PDP do governo federal é o da farmacêutica Merck contra a esclerose múltipla. Tais Ramadan, diretora de relações com o governo na companhia, afirma que o acordo de transferência de tecnologia com a Biofarmanguinhos e a Bionovis da sua betainterferona (Rebif®), tem como alvo os 16 mil pacientes com esclerose múltipla que são tratados pelo SUS. “Quando o acordo foi firmado (2015), a estimativa de economia aos cofres públicos era de R$ 27 milhões, em sete anos”, destaca.

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